terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Rio de Ilusão: Torrando



Rio de Ilusão

Torrando

          - “Detesto o verão do Rio!... Esse calorão!... Se eu pudesse, saía daqui em outubro, voltava em abril!... Ia pra serra, prum lugar bem fresquinho!”. Cansei de dizer isso, cara, durante anos, você deve ter ouvido...
          Aí, você pergunta, quê que eu tô fazendo aqui, em Ipanema, na praia, num domingo de janeiro, desde o meio-dia até agora?... E (pior!...) usando esse ridículo calção de banho, comprido que nem cueca samba-canção, todo esgarçado, puído e ainda por cima apertado!...
          Bem, esse foi o que me restou... Logo eu, que estou mais branco do que vela. Se deixasse a bunda de fora ninguém ia notar: é um branco só!... Pô, cara, ainda bem que eu te vi aqui cuidando dessa barraca!
          É pras crianças, né?... O jeito é pegar carona, você não vai se incomodar... Também, é o último lugar em que elas param!... Não saem da água, impressionante... Eu, quando eu era garoto, também não saía da água. Hoje, o que me preocupa é o sol... Meu avô parece que teve um câncer de pele e olha que na época nem tinha buraco do ozônio... Cearense, muito branco, vai ver descendia de holandeses...
          Eu costumava vir à praia no final do expediente: chegava às quatro, saía às oito. Ah, pra isso o horário de verão serve. Bati muita palma pro por-do-sol, caindo ali ao lado do Dois Irmãos!... Tive época assim, enturmado. Já começava o verão na praia, ia me queimando aos poucos. Ficava até moreninho, atraente...
          Engraçado, nunca saí acompanhado da praia... Rolava muita conversa, papo bobo, mas nas festinhas é que acontecia qualquer coisa. Esse mulherio todo, as pernocas, os peitos, as bundas de fora... Mulher demais acaba dando um certo fastio, né?... Por isto o topless não pegou no Brasil.
          Ah, mas também quando você fica a fim... E tá me acontecendo agora, eu nem esperava mais!... Tô é a fim dela!... Se não, mérmão, não estaria aqui, torrando...
          Não sei por que ela cismou de marcar comigo na praia... É garotona, tá acostumada. E sabe que eu faço o que ela mandar, é... Mas não precisava me dar essa sacaneada...



Torrando na praia – Ipanema, Rio – Aguinaldo Ramos, c. 1982


      Quer saber?... Vou embora!... Não sou tatuí!... Nem jacaré!... Se é pra levar bolo da gatinha, prefiro à noite, num bar, tomando cerveja... Esquenta menos a cuca, num tô certo?...
         Valeu, vou nessa!...
 

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Guina&dita Contos Cariocas


Para relembrar o escrito e publicado,  

coloca à disposição do leitor a série 
Guina&dita Contos Cariocas”, 
publicando quinzenalmente
(dois deles sempre no ar) os contos de 
Rio de Amores”, livro de Guina Ramos 
sobre o amor, o Rio de Janeiro e outros mistérios.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Rio de Janeiro: Um Olhar Amoroso

Um Olhar Amoroso

 
- Hummm... Merecia uma foto!... Assim, nua, deitada na cama...  Sabe o que me lembra?... Uma visão, um panorama que conheço... Que também dá uma bela foto...
 - Hum?... Um visual?... Hem?... Qual?...
 - As montanhas do Rio de Janeiro!... Sabe como é?... Chegando de Petrópolis, vem vindo a estrada, reta. De repente, uma curva, uma descidinha... Aí, você dá uma olhada pro Rio. Um olhar abrangente, geral... Lá, nas montanhas, vê uma mulher, deitada... Em toda a sua extensão. Nua, linda... Igual a você, aqui, agora...
- Eu?... Hummm...
- É, você. Você olha para as montanhas do Rio e vê, à direita, o perfil da cabeça, os traços suaves do rosto, os cabelos ondulados. Assim, bem do seu jeito... Vai percorrendo o corpo com o olhar. Os seios... Lógico, assim de lado, só se vê um... Mas não dá para comparar!... Os dela são grandes, fartos, bojudos. Para você ter uma ideia, correspondem ao Pico da Tijuca...
 


- Sem dúvida, bem maiores que os meus...
- Outra escala... E os seus são muito mais acessíveis...
- Hum, tá!... Continua.
- Depois, o tronco. Quadris, coxas, joelhos, pernas... Tudo facilmente reconhecível no perfil das montanhas. Se o olhar não for amoroso, até pode-se achar defeitos, uma parte mais longa, outra mais curta... Daqui, por exemplo, olhando você, não vejo defeito algum...
- Sei... Um olhar amoroso... É, tá certo... Você também, sentadinho aí, até parece razoável... Se vier pra cama então, melhora um pouquinho... 
- Os pés... 
- Quê que tem os pés?...
- Você acredita?... Nesta mulher-gigante das montanhas do Rio, os pés são o morro do Corcovado!... Igualzinho!... Um aclive forma o peito do pé. Um corte abrupto, vertical, a sola. Claro, visto lá da Zona Norte... 
- Pois nunca imaginei... Já vi o perfil de rosto de homem lá na Pedra da Gávea, olhando da Barra, nariz adunco assim como o seu. Mas, tal figura, deitada por extenso no Rio... O Pão de Açúcar, afinal: fica fora dessa maravilhosa mulher da cidade?...
- Ah, o Pão de Açúcar fica bem em frente, firme, atento. No mesmo estado em que estou...
- Uau, estou vendo... Cresceu bastante seu interesse pelo assunto, não é?...
- Pois é... O Pão de Açúcar é assim mesmo, surpreende... A aparência varia, conforme o momento, a situação, o clima... Geralmente é visto ereto, empinado, desse jeito, como se estivesse a ponto de mergulhar na enseada de Botafogo, na baía de Guanabara... Lá de Niterói, das estradinhas que dão nos antigos fortes, pode-se vê-lo em toda sua pujança...
- É mesmo?... Tanto assim?...
- Bem, compreenda... O Pão de Açúcar é uma peça de granito sólido, não sei se é caso de comparar... Bastante volúvel, também. Em outros ângulos, outros momentos, se mostra recolhido, relaxado, pensativo até... E a sua imagem, talvez refletindo o espírito da cidade, vai, às vezes, a outro extremo. Visto do Corcovado, em meio à neblina do outono, parece mais... Um seio!... Um belo e apetitoso seio feminino, brotando por entre os lençóis de nuvens. Tem até um biquinho durinho, a estação do bondinho...
- É mesmo?... Algo assim?...
- Hum... Mais ou menos... Não tão suave, sem dúvida...
- Pena não tratarem sempre essa tão elogiada superfície com o devido respeito... Ou carinho... A energia, tão masculina, que construiu a cidade, muitas vezes foi prepotente, exagerada... Arrasou morros (e lá se foi o do Castelo), secou lagoas, cortou matas... E nem sempre se dividiu, entre todos, por igual.
- Sim, foram, e ainda são, tempos de estranhamento. Um lugar, por sua graça feminina, muito disputado. Um contato inicial complicado, o difícil aprendizado da convivência... Sempre o atrito entre essas duas rústicas naturezas, a terrena e a humana!... Agora temos, ao menos, que conservar o que resta. As árvores da Floresta da Tijuca, por exemplo... Ainda estão aí...
- Uma vasta, uma bela cabeleira... Que, um dia, chegou a ser desbastada. Que, agora, está novamente garbosa, renascida...
- A beleza sempre surpreende... Dá um jeitinho, capricha na maquiagem, faz uma plástica... É o caso do Aterro do Flamengo, que, de artificial...
- Faz, agora, parte da paisagem!...
- Exato!... E tem as curvas...
- Curvas?...
- Sim, as do Aterro, por exemplo!... Sensuais, langorosas... E as de Copacabana, de Ipanema, de São Conrado... Curvas que preenchem o olhar. Quem vê, quer logo acariciar...
- Estas, aqui, você pode...
- E sempre o coração batendo forte!
- Sim, o coração... Ah, tem que ser bem grande, para caber tanta gente... Um grande coração, como a Lagoa vista lá do alto!... Essa foto eu vi...
- Um coração forte, firme. Que é pra aguentar tantas batidas, tantos sustos, tanto maltrato... E acima de tudo generoso.
- A terra é fértil. Mesmo recebendo pouco amor, ainda assim acolhe... E retribui.
- E, com o tempo, cresce a admiração, a paixão vai aumentando...
- A vontade de ser feliz, a alegria de viver, o jeito leve de ser.
- Hum... Com toda essa conversa, você fica ainda mais aconchegante...
- Ah... Com toda essa história, você fica cada vez mais querido...
- Huuum, aqui estou eu, minha terra carioca!...
- Ah, sou toda sua, meu Rio de Janeiro!...

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Contos Cariocas: apresentação


Guina&dita Contos Cariocas

2015, novo ano à frente: muitas páginas (ou telas de computador) a preencher!...
Mas, não vamos nos esquecer do passado: há obras em arquivos, estantes e memórias!
Para relembrar o já escrito e publicado, Guina&dita coloca à disposição do leitor 
a série “Guina&dita Contos Cariocas”, 
publicando quinzenalmente os contos (dois deles sempre no ar) de 
Rio Só de Amores”, livro de Guina Ramos 
sobre o amor, o Rio de Janeiro e outros mistérios.



Apresentação de Rio Só de Amores, pelo autor

Rio Só de Amores: alguns motivos e um desejo
.
           Este livro de contos tem dois grandes motivos, o amor e o Rio de Janeiro, e alguns mistérios. Seria ocioso dizer “não necessariamente nessa ordem”, pois se há coisa e lugar que não aceitam necessariamente qualquer ordem são, realmente, o Rio de Janeiro, o amor e os mistérios...
            Ainda assim são roteiros, muitas vezes disfarçados em drama, em comédia, em qualquer classificação que o leitor queira dar... Neles, nem sempre explícitos, estão as artes, os parques, as ruas, as vias, as mídias, vários etcs do Rio de Janeiro. Seria um mapeamento do amor no Rio, tivesse tal esforço suficiente sentido...
Em suma, são amores e são do Rio (e os mistérios também). O título Rio Só de Amores pode ser um aviso de que, mesmo não se levando nada muito a sério (estamos no Rio, são amores e há mistérios, lembram?...), poderá haver motivações ocultas, pessoais, particulares. É possível... (...) O autor é o menos indicado para dizer mais, saibam (sabem...), mas talvez possa sugerir que, mais que contos, sejam sugestões, ou, mais que reflexos, reflexões, e sempre sobre a velha arte de viver a vida.
Ou dicas, quiçá... A serem seguidas, talvez, por quem tenha uma tanta coragem... À sua falta, fiz, entre 2003 e 2007 (e é como se fosse uma cápsula do tempo, diante das mudanças impostas ao Rio), estas visitas, por escrito, a, entre tantas, algumas poucas faces do amor e a ainda menos mistérios, que se declaravam cariocas...
Nestes passeios, entre letras e curvas, a variedade de estilo é o estilo. Certamente é assim não só pelo exercício da escrita, mas pela demanda inerente a cada assunto ou pela necessidade específica de cada relação afetiva. A cada um dos doze contos mais densos (ou, ao menos, mais volumosos), vagamente inspirados nos meses do ano (a partir do Janeiro do Rio de Janeiro), segue-se, para relaxar, um pequeno conto de um gole só, como se toma uma taça de água após provar um vinho... (...) Mantém o bônus do bônus, os Outros Mistérios, contos de certo espanto, alguma admiração e um tanto de humor, que não se obrigam a muita lógica interna mas agradam ao autor...
O leitor, munido de flexibilidade, não tropeçará neste emaranhado de contos (agora simplificado) e poderá achar algo de bom. Se devolver ao livro um sorriso, um abanar (e abaixar) de cabeça, um muxoxo (tsc, tsc, tsc...), algo assim, e se isto o satisfizer (não diria dar prazer...), tenha certeza: deixará o autor feliz! 
Tomara, caro leitor, que, neste Rio Só de Amores, não lhe sejam indiferentes estes contos, posto que também eu, o autor, à minha maneira, rio só de amores. 
Guina Ramos
Nascer do sol no Pão de Açúcar, Rio de Janeiro - Aguinaldo Ramos, 2001